Apesar de tantos apelos: crédito fácil, parcelamento, cheque pré-datado, desconto, há pessoas que não querem saber de comprar se o dinheiro não estiver disponível. E cada uma delas tem uma justificativa para não mudar de ideia.
Sandra Maria Silvestre costuma caminhar no centro de São Paulo olhando, com atenção, todas as vitrines. Ela estuda as possibilidades de compra e leva em conta o planejamento – não a vontade de colocar a mão no bolso.
“Como sou cabeleireira, recebo a cada 15 dias. Por isso, no dia do pagamento, eu quito as contas fixas e o que sobra dedico ao que gosto: perfumes, cremes, roupas. Mas sempre compro à vista.”
Com bens duráveis, o procedimento é o mesmo: a última escolha de Sandra foi um forno de micro-ondas de R$ 600. Ela esperou a época de promoção na loja e adquiriu o produto por R$ 370 – em dinheiro. “Trata-se de um costume que já passei para minha filha. Todos os meses eu separo R$ 300 do salário e guardo na gaveta. Depois, é gastar sempre com desconto porque é à vista.”
Dinheiro x Cartão
No entanto, a decisão de Sandra de fugir do crédito ou do parcelamento não vem desde cedo. Há cerca de dez anos, ela comprava tudo com cartão, ou fazia carnês. Quando as dívidas explodiram, a cabeleireira decidiu se livrar de tudo. “Hoje, os bancos me oferecem vários produtos e eu digo não. É tentador ter um cartão de crédito na carteira diante de um lindo sapato. O planejamento, para mim, é um modo de vida”, afirma Sandra.
A bancária Viviane Marcinari é a feliz proprietária de um carro zero quilômetro. Na hora de escolher o veículo, há dois meses, ela ouviu o vendedor detalhar as taxas de juros do financiamento e disse que faria a aquisição à vista. “O valor do automóvel era R$ 45 mil. O antigo foi avaliado em R$ 37 mil. O restante foi pago em dinheiro”, diz Viviane.
Ela afirma que sente pavor só de pensar em ter contas para o mês seguinte. “Tem gente que não se importa em fazer dívidas. Eu nunca tive esse hábito. Minha família costuma guardar na poupança pelo menos 15% do salário mensal. Isso significa paz.”
Pé no chão
Se houvesse uma expressão para designar o estilo do consumidor que só compra à vista, poderia ser “pé no chão”, segundo a psicanalista especializada na área financeira, Vera Rita de Mello Ferreira. “As pessoas mais cuidadosas não gostam de ter dívidas. Elas se sentem mais confortáveis em utilizar dinheiro – quando o têm – do que precisar pagar contas em um futuro próximo. Resumindo, são consumidores que sabem planejar”, afirma a psicanalista. “Quem prioriza a compra à vista não fica seduzido com propagandas de milhagem do cartão de crédito, por exemplo. É gente que tem um objetivo definido, só gasta o que tem – não se ilude.”
Dor de cabeça
Já a psicóloga Olga Tessari define a pessoa que não quer saber de parcelamento como aquela que pensa no futuro. “Esses consumidores consideram a possibilidade de perder o emprego, a renda e não conseguir arcar com um financiamento de automóvel de 60 meses, comum atualmente. Trata-se de uma modalidade de compra que pode ser entendida como um sinônimo para dor de cabeça”, afirma Olga.
De acordo com ela, o nome limpo é encarado como o bem mais precioso para esse tipo de comprador. “Tem gente que não consegue mudar o hábito de consumo nem quando se envolve com dívidas e juros altos – e acaba se enrolando com os valores. Mas depois de uma experiência assim, há consumidores que pensam dez vezes antes de se arriscar”, diz a psicóloga.
Fonte:DComércio